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As cachalotes conversam em código morse
(os humanos conversam em umbiguês)
Boletim Lunar
A lua está quaaase cheia no momento que encerro essa newsletter (99% da superfície visível) e já não estará mais tão cheia no momento que deve chegar no seu email, no entanto fique aí com essa sensação de quase completude, ela é boa também. A maré está baixando, lentamente, considere isso como um sinal de que você ainda tem tempo, seja lá para o que precise fazer.
Hoje entre Luas e Marés você encontra:
Uma escritora cientista inconformada com documentários e a forma limitada com que pessoas se comunicam, novidades (mais ou menos) e indicações de leituras. Não sei quanto tempo em média é necessário para ler essa edição, mas vá no seu tempo — e não se esqueça de vestir seu colete salva-digitação para não se afogar em possíveis erros de digitação.
As cachalotes conversam em código morse (os humanos conversam em umbiguês)
Eu sinto falta dos documentários de natureza antigos, com nada além da voz de um narrador que mal vemos ao longo de uma hora da vida selvagem como ela é. Daqueles com cenas monótonas mostrando os vários minutos de inatividade de zebras mastigando, tentativas falhas de predadores tentando capturar a presa, aves construindo um ninho do zero. Sem muitos cortes, sem grandes edições. Sem uma história.
Talvez seja contraditório eu, uma escritora, falar isso. Mas eu também sou cientista, e por mais que eu ame a fantasia, eu também me encanto pela realidade — a fantasia que eu escrevo nasce da realidade, do que observo e escuto e tento compreender. Especialmente a realidade natural, de animais e plantas e fungos vivendo como sempre viveram ao longo de milhões de anos — no tempo deles, no ritmo da ecologia de cada organismo, sem o enquadramento de uma olhar humano cada vez mais acelerado e desinteressado pela vida como ela é.
Quem me acompanha já de algum tempinho sabe do meu amor pelas orcas. Orcinus orca, talvez a espécie mais temida dos oceanos, possivelmente o terror dos bilionários. Desde que eu vi o filme do Free Willy pela primeira vez, ainda criança, foi caso de amor a primeira vista e desde então de um jeito ou de outro fui perseguindo as bonitas pela vida. Ainda criança, desenhava a trilogia de filmes com giz de cera (e meus pais guardaram esses desenhos pra provar), usava camisetas de silk com cenas de orca, via todo e qualquer documentário sobre elas que passasse pela minha frente... depois de vários preâmbulos de carreira na adolescência fui fazer oceanografia cheia de convicções muito lógicas sobre uma profissão multidisciplinar, secretamente torcendo por uma oportunidade de topar com elas... fui estagiar no MAQUA, um dos maiores produtores de conhecimento de mamíferos marinhos no Brasil, me especializei em bioacústica de cetáceos e poluição sonora marinha... corri atrás delas (literalmente) nas praias patagônicas, vomitei no meu primeiro encontro ao vivo e a cores com elas num barco, tive a oportunidade de analisar sons delas gravados na Antártica. A geografia do meu nascimento e a distribuição da espécie atrapalhou um pouco fazer uma carreira em torno delas, mas posso afirmar que de um jeito ou de outro, aquele fascínio de infância me moveu pelos caminhos profissionais tomados. Me posicionou na carreira acadêmica, me colocou nos lugares certos nas horas certas para tantos outros aspectos importantes da minha vida como relacionamentos e viagens e aprendizados.
É uma volta meio longa, mas não é exagero dizer que correr atrás das orcas acabou me colocando também no caminho de ser escritora, mas essa é uma história mais íntima. Quem conhece, conhece.
Esses dias eu andava com saudade delas, de ficar pensando e admirando, então parei pra ver um documentário sobre orcas na costa da África do Sul. Fiquei triste. Quase uma hora inteira de informações resumidas demais e cortes repetitivos de segundos com trilha sonora inflamada para nos fazer prestar atenção numa história montada por um editor humano e que não existe, tão ficção quanto os livros na minha estante. Não preciso do tal do story telling, poderia ficar horas vendo orcas e vários outros bichos “fazendo nada”, e gostaria que as outras pessoas não precisassem também.
Cada vez mais, o ser humano vem se tornando um mal observador. Da natureza, da vida, de si mesmo. Não quer ver, não quer escutar. Quer apenas se entreter, quer espelhos por toda parte, inclusive no mundo selvagem.
A chateação com o documentário me deixou cozinhando esse texto, e me levou a pensar em outro leviatã dos oceanos.
O que muita gente não sabe, é que eu tenho uma outra espécie xodó, que também é bem famosa: as cachalotes, os torpedos feiosos mais lindos do mundo animal. Já falei algumas vezes sobre essa espécie na newsletter, ela teve destaque no meu texto sobre as baleias de Melville e Verne, e acho que já comentei vez ou outra em alguns textos marinhos. Nome científico: Physeter macrocephalus, única espécie de seu gênero, Physeteridae, e única entre os odontocetos (os cetáceos com dentes) em geral, por vários motivos. Além de ter um tamanho bem maior que a maioria das espécies do grupo dos odontocetos, também produz o óleo spermaceti (e sim, daí o nome em inglês da espécie, sperm whale), uma substância na cabeça das cacholetes responsável por auxiliar na propagação de seus sinais acústicos. Também é nas entranhas das cachalotes que surge o ambergris, uma pedra cerosa e fedida que de algum jeito muito engenhoso acabou virando o principal ingrediente de perfurmes durante muito tempo. E elas falam em código morse! (ok, estou exagerando para fins de story telling, de te manter aqui preso comigo nesse texto por mais um tempinho. hipocrisia que fala?)

Ilustração antiga de uma cachalote e original do livro “Vinte mil léguas submarinas” de Júlio Verne, mostrando duas cachalotes com o corpo quase todo por cima das ondas de um mar agitado.
Assim como todos os odontocetos, as cachalotes são capazes de ecolocalizar. Explicando de forma resumida é o mesmo princípio básico do funcionamento dos sonares de submarinos, ou mesmo das sondas simples de pesca: o animal emite um som, e capta o eco desse mesmo som, sendo capaz de visualizar os obstáculos à frente a partir disso. Quanto maior a velocidade de emissão desse som, mais detalhada a imagem gerada pelo eco em termos de formas, texturas e densidades. É uma habilidade poderosa para viver num mundo oceânico onde a luz não é uma forma muito eficiente para perceber os arredores, e em toda a história evolutiva apenas dois grupos de animais desenvolveram a ecolocalização: os odontocetos (golfinhos e demais cetáceos com dentes, como as cachalotes) e morcegos.
No caso dos odontocetos, o som utilizado na ecolocalização é um pulso. Um pulso pode ser explicado como um som muuuuito curto que ocupa muitas bandas de frequência no mesmo instante de tempo. As frequências ocupadas por esse pulso vão variar de espécie para espécie, e nas cachalotes podemos dizer que esses pulsos vão ocupar frequências médias (na verdade, relativamente baixas se comparadas a outras espécies), em torno de 15 kHz — bem dentro da nossa parca capacidade auditiva, aliás.
Mas até aí, tudo bem. É especial no contexto natural, mas não tão diferente no contexto dos odontocetos. O que destaca a comunicação das cachalotes no meio marinho é que pulsos são a principal forma acústica com que se comunicam. Nos cetáceos em geral observamos muitos tipos diferentes de sons, e boa parte das espécies é capaz de produzir uma grande variedade de sinais em duas categorias principais: sons tonais (popularmente conhecidos como assobios) e sons pulsados. As cachalotes e um punhado de outras espécies de odontocetos, contudo, só produzem sons pulsados: os pulsos que usam para ecolocalizar (navegar pelo ambiente e encontrar suas presas), e os pulsos que usam para conversar.
Visualmente falando, os sons tonais (dos cetáceos) são bem mais complexos que os pulsos, podem possuir centenas de contornos e mesmo contornos “iguais” podem ter variações de frequência e duração — uma das fronteiras atuais do estudo da comunicação de cetáceos passa justamente por delinear todos esses contornos, entender como eles variam, se seguem algum padrão ou não, e a partir daí entender o que significam. Já sabemos que muitas espécies de golfinhos podem ser diferenciadas por seus sons tonais, possuem um repertório próprio desses sons que servem não apenas para identificar a espécie ou o grupo familiar que os utilizam. Em populações estudadas há muitos anos, pesquisadores são capazes de saber que determinada família de orcas passou por uma região apenas pelos sons que gravaram, por exemplo.

Conjunto de gráficos do tipo espectrograma mostrando contornos variados de sons tonais produzidos por um grupo de golfinhos. Fonte: Probert et al., 2023.
Sabemos o que cada um desses contornos significa? Bom... existem alguns indícios, para alguns desses contornos, e apenas para algumas espécies.
Você já viu aquele filme “A chegada”? Se lembra dos símbolos circulares que Abbot e Costello usavam para se comunicar?
Não, não é a mesma coisa, mas o princípio de questionamento se mantém.
Nós, seres humanos, mesmo com os nossos variados idiomas de diferentes etnias e culturas, nos comunicamos oralmente seguindo uma lógica de construção de ideias: seja a construção de palavras cujos fonemas têm um significado próprio e ao serem combinados produzem um novo significado, seja a construção de frases em que palavras com significados individuais ajudam a formular uma ideia mais complexa. Independentemente do idioma e do arcabouço por trás, é um padrão da comunicação humana o uso desses sons e ideias separados que juntos seguem uma sequência com início, meio e fim bem claros. (Estou falando bem resumidamente para fins de não te deixar fugir desse texto!)
É comum, então, intuir que outras espécies se comunicam da mesma forma. Na verdade, é tentador pensar desse jeito: supor que cada sinal tonal (ou pulsado) produzido por um golfinho é como um fonema ou uma palavra, e que um conjunto de sinais constrói algo como uma frase. Isso implicaria na construção de um dicionário simples, mas ao invés de português-inglês, português-golfinhês (ou baleiês, se você frequentar a escolinha da Dory). Mas a verdade verdadeira, é que não sabemos.
Não sabemos se um único contorno como o da imagem acima equivale a uma palavra, ou se cada pedacinho desse contorno traz uma ideia diferente e a menor inflexão de frequência pode alterar ou não esse significado. Talvez haja por aí pesquisadores de bioacústica mais orgulhosos do que eu, pesquisadores que vão te afirmar que estamos muito perto de saber — não estamos. Por enquanto, e as ferramentas de inteligência artificial têm sim acelerado o processo, somos muitos bons na parte do catalogar. Registrar diferentes tipos, quantificar repetições, detectar padrões... significado? Não.
É claro que no meio desses padrões conseguimos reconhecer coisas interessantes, como sinais que são mais comumente emitidos em momentos de alimentação ou na interação entre mães e filhotes. Isso já é muito. Mas saber se estamos ouvindoum “vamos comer, comida para todos!” ou um “quem comer o meu vai se ver comigo!”, bom... não.
Então, e as cachalotes?
Aqueles sons tonais bonitos da imagem que eu mostrei ali em cima? Não fazem. Elas fazem sons pulsados, em geral, pulsos individuais. É o que elas têm pra achar a comida e pra mandar a criança parar de brincar com a comida. Um pulso, por sua própria característica estrutural, não abre margem para tantas variações de forma. A solução delas então foi a padronização das emissões desses pulsos.
Ou seja, código morse! Mais ou menos. Bem mais ou menos.
No mundinho das cachalotes, chamamos os diferentes padrões de emissões de pulsos de codas. E existem vários diferentes. Em geral, os padrões são compostos (analogamente ao código morse) de pulsos separados por silêncios. Então, podemos ter 3 pulsos emitidos num intervalo curto e então um intervalo mais longo antes de um quarto pulso (esse padrão é conhecido como 3+1). Existem dezenas de padrões de codas já reconhecidos. 1+2, 2+1, 4, 3+2…

Espectrograma mostrando uma sequência de pulsos de cachalotes emitidos num padrão 3+1. Fonte: oceanomaredelphis.com
Mais uma vez, essa uma situação “A Chegada”. Reconhecemos esses padrões, mas ainda não podemos afirmar exatamente o que significam. Em tempos bem recentes viralizou uma matéria trazendo o resultado de um estudo em que “graças a IA vamos ser finalmente capazes de conversar com as baleias”. Bem... sempre pudemos. Existem várias formas de se comunicar com qualquer animal (e qualquer pessoa que crie animais domésticos seria capaz de descrever em mínimos detalhes as formas criativas que seus cães e gatos usam para pedir comida mesmo sem falar uma palavra de humanês). E no caso da matéria em questão, o que aconteceu resumidamente foi: usamos IA para detectar um padrão, transmitimos esse padrão para as cachalotes, e elas responderam de volta. Ótimo. O que dissemos a elas? Não sabemos. Espero que tenha sido algo elogioso, caso elogios signifiquem alguma coisa no mundinho delas.
Há quem diga que é muito humana essa necessidade de se comunicar.
Depois de mais de dez anos estudando bioacústica animal, eu diria que é muito biológico. A comunicação nos mantém vivos, e quanto mais complexa a nossa interação com nossos conspecíficos ou com espécies próximas, mais complexa essa comunicação se torna.
O seu cachorro sabe que você está bravo só pela entonação da sua voz ou até mesmo por um olhar, ele não precisa de um dicionário formal de humanês. Da mesma forma, sabemos quando nosso gato tá puto da vida. Talvez não saibamos identificar todos os indícios de irritação de todos os gatos do mundo, mas reconhecemos alguns sinais universais e para além disso entendemos mais ainda da linguagem desenvolvida na intimidade da vivência próxima. Num outro exemplo, os pais de crianças pequenas comumente sabem identificar exatamente qual bichinho de pelúcia o filho quer enquanto nós só ouvimos algo como babuquiadamaama. Como esse entendimento ocorre? Convivência, observação, paciência.
Cada ser vivo que tem a necessidade de se comunicar o faz da forma que lhe cabe, dentro de suas restrições fisiológicas e necessidade impostas pelo meio. Cachalotes pegaram pulsos simples e inventaram padrões complexos, cães da pradaria aliaram assobios curtinhos junto de movimentos específicos, aves combinaram canto e dança, humanos se tornaram prolixos através de muitas formas e materiais. A busca por um significado direto, como num dicionário... essa sim é muito humana, junto de toda a nossa necessidade de colocar as coisas organizadas em caixinhas. E também junto da nossa necessidade antropocêntrica de ver humanos de quatro patas, ou com penas e bicos, ou escamas.
Sempre fico muito intrigada com a suposição de que: 1) temos algo de importante para conversar com baleias; e 2) as baleias tenham qualquer consideração sobre o que queremos dizer.
E isso não é dizer que não tenho interesse sobre as conversas delas. Não teria se tornado uma das minhas áreas de pesquisa se eu não tivesse essa curiosidade. Mas tal qual o documentário estilo antigo e monótono da vida selvagem, não quero “traduzir” a conversa das cachalotes ou qualquer outra espécie para trazê-las mais para dentro da esfera humana. Quero compreendê-las para sair da nossa esfera. Observar. Aprender. Mergulhar num mundo diferente.
Também acho um pouco hilária a suposição de que sejamos capazes de traduzir fidedignamente os sinais de outras espécies. As amigas tradutoras sempre repetem aquela famosa frase que todo tradutor é também um traidor. Mesmo entre idiomas humanos e com todas experiências universais da nossa espécie, sempre existe uma perda na tradução, ou uma necessidade de adaptação. Supor uma conversa entre humanos e cachalotes também é de certa forma supor que um dos lados vai precisar ser muito paciente com as limitações de inteligência do outro, supor que um dos lados já tem todas as informações de que precisa e só tem que montar as entradas no dicionário, supor que um dos lados tem muito mais a dizer do que o outro.
De certa forma, é como andamos nos comunicando uns com os outros, entre humanos falantes do mesmo idioma mesmo. Falando, falando, falando (compartilhando, compartilhando, compartilhando...), pouco escutando.
Hoje em dia todo mundo tem tanto a dizer. (Como eu sou escritora, faço a minha mea culpa nesse quesito, mas em minha defesa prefiro dizer silenciosamente com as palavras do que tagarelando.) Com tantos dizeres, me pergunto quem escuta e como escuta. Vivemos numa cacofonia constante do nosso próprio story telling, documentários da vida selvagem humana demonstrando todo tipo de coisa, torcendo para que alguém do outro lado da tela se identifique com nossos pequenos grandes dramas e conquistas, se reconheça (e deixe um like e compartilhe). E é muito triste que com todo o arcabouçou tecnológico criado para que humanos gritem as histórias de suas vidas, e estejam o tempo todo buscando conexão e compreensão, ainda somos incapazes de fazer isso.
Aquela velha história da internet. Uma pessoa posta uma foto dizendo que gosta de banana, e aí vem outra pessoa e pergunta nos comentários o motivo dela odiar laranjas. Ou então, uma pessoa de um determinado país posta um vídeo mostrando sua cultura rica, e vem um cidadão do outro lado do mundo comentar que aquilo é nojento e todo mundo daquela cultura merece morrer. Ou ainda, alguém escreveu um livro sobre UM TEMA, e as pessoas reclamam que a o livro deveria ter abordado OUTRO TEMA, como se não houvesse vários outros livros no mundo exatamente como elas querem.
Ainda temos muita dificuldade de olhar para O Outro. Reconhecer e admirar O Estranho pelo que ele é: apenas diferente. Também temos muita dificuldade de entender que nem tudo é sobre nós ou para nós, seja enquanto espécie ou quanto indivíduo.
Um universo inteiro existe além do nosso umbiguinho antropocêntrico, mas parecemos estar presos nessa contradição: sentimos a necessidade de nos comunicar, e parecemos cada vez mais limitados nessa capacidade. Escrevemos textões (desculpa), gravamos vídeos, fazemos arte, discursamos, palestramos, colocamos tudo pra fora... e ainda parece ser insuficiente.
Fico encantada de olhar para os codas das cachalotes e pensar que aquele conjunto de padrões é mais do que o suficiente para dizerem umas às outras tudo que precisam. Veja bem, essa forma de comunicação não surgiu ontem. As cachalotes se valem disso há muuuuito tempo, é mais antigo do que a palavra escrita e todos os idiomas humanos. Não é de maneiras alguma uma comunicação limitada e ineficiente. Se fosse, teria sumido com o tempo.
Acontece que um dos conceitos básicos de comunicação é que para ocorrer, precisa haver no mínimo dois indivíduos. Enquanto um manda uma mensagem, o outro recebe. A decodificação dessa mensagem depende de algo essencial: escutar (ver, ler)... se dar o tempo de não imediatamente cuspir uma mensagem de volta.
As histórias das cachalotes são diferentes das nossas; têm que ser, nem que seja pelo simples fato de que vivem embaixo d’água e nós, não. E entender essas histórias exige uma atenção desapegada de nós mesmos, de nossas certezas e expectativas. (*entra o meme da Bela Gil: Você pode substituir “cachalotes” por “pessoas” nessa frase, por exemplo!*)
Se enquanto espécie somos incapazes de aplicar essa mesma lógica uns com os outros, fico bem pessimista quanto a conversas com cachalotes, por enquanto.
Não consigo deixar de pensar que enquanto não formos capazes de observar animais e plantas sem tentar entendê-los de forma humanizada, não seremos muito mais eficazes em compreender todo o resto. Sabe, os segredos da vida, do universo e tudo mais.
Espero não ter te deixado pessimista ou desanimada com esse texto. Falei tudo isso na esperança de que mesmo que você discorde de tudo que eu falei, se permita pelo menos o tempo de respirar fundo e ouvir mais de tudo que é dito por aí antes de falar de volta. Quanto mais gente ouvindo, menos barulho. Quanto menos barulho, maior a chance de entendimento — inclusive para a discordância.
Novidades
Por enquanto, nada novo... que eu possa divulgar! Um dos segredos da boa comunicação é também saber a hora certa de mandar mensagens, fazer anúncios, contar novidades. Saibam que tem coisas acontecendo, e quando eu puder falar, venho aqui.
O que posso dizer nesse momento:
estou editando loucamente meu próximo livro que sai pela Editora Rocco (ainda sem data)
fãs de Marea Infinitus, uni-vos! O aniversário de dois anos da publicação desse conto está chegando, e eu resolvi comemorar. Fiquem atentos aos canais do Sem Spoiler para descobrir como.
A maré trouxe
Depois de um textão desses sobre comunicação, tradução, compreensão de vivências diferentes das nossas, não podia deixar de indicar dois livros (radicalmente diferentes um do outro).
Língua Nativa, de Suzette Haden Elgin, traduzido por Jana Bianchi na Editora Aleph, é uma ficção científica sobre muitas coisas (de certa forma, até sobre conversar com baleias). Sinopse: Em 1991, o direito feminino ao voto e à participação política são sumariamente revogados. Em 2205, são consideradas úteis apenas as mulheres que podem servir aos homens em cargos específicos e a eles subordinados. Contudo, a economia mundial depende de um número reduzido de mulheres linguistas, que atuam como tradutoras em negociações entre povos alienígenas e corporações familiares da Terra. Quando perdem sua utilidade, elas são enviadas para as Casas Estéreis, onde apenas aguardam a morte. Mas um pequeno grupo de mulheres vem desenvolvendo clandestinamente uma linguagem própria para resistir à opressão masculina. É nesse cenário que a linguista Nazareth Chornyak chega à Casa Estéril de sua Família. Dona de talentos únicos, ela pode ser peça-chave de um movimento audacioso: desafiar o poder dos homens e dar início à revolução.
Prosérpina, da Anna Martino, será lançado dia 14/04 pela Editora Madame Houdini. É um romance (romântico) sobre enxergar, admirar quadros e ser admirado de volta por eles, sobre ver sentimentos como cores e perceber muito sobre as pessoas. Prosérpina conta a história de Theo, um colorista cuja vida ganha novos tons quando recebe a tarefa de investigar um quadro misterioso, envolto em rumores de que pode se mover. Mas, entre cores e sombras, ele encontra mais do que magia: a figura de uma mulher de cabelos dourados, segurando uma romã, que pode transformar não apenas sua arte, mas também seu coração.
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