Os nomes das luas

(e a marcação do tempo)

- Boletim Lunar -

Início da escrita: Transição da Lua Nova para o Quarto Crescente, com ainda apenas 19% da superfície lunar visível. Pico da maré alta, entrando na época da maré de quadratura.

Término da escrita: Transição da Lua Nova para o Quarto Crescente, com ainda apenas 38% da superfície lunar visível. Ponto mais baixo da maré baixa, começando a encher e entrando na época da maré de quadratura.

Data de envio: Quarto Crescente, com 50% da superfície visível. Maré enchente, no meio do caminho entre alta e baixa.

Luas & Marés #2 - Consultado pela Tábua de Maré do porto do Rio de Janeiro

Os nomes das luas

Eu venho cozinhando esse tema para a newsletter já faz um tempo, e nessa onda de vermos os livros desfilando na Marquês de Sapucaí e encarar o Lunário Perpétuo no desfile da Porto da Pedra a coisa acabou transbordando e cá estou eu.

Na edição passada falei do tempo e dos ciclos na figura do Temeraire, uma promessa de que o mar não foi embora. Acho justo então trazer nessa segunda edição da identidade nova a outra metade do nome. Vamos falar de luas? Não as várias luas universo a fora, satélites de outros planetas, mas a nossa própria e única, ganhando novas roupagens mês após mês ao longo do ano, atravessando muitas culturas.

Você sabia que as luas cheias têm nomes em alguns lugares? Venha.

A edição passada foi enviada justamente na primeira lua cheia do ano, a Lua do Lobo. Mas quero começar esse texto falando da Lua Azul, que é um pouco especial, e para isso vamos dar uma breve volta na marcação do tempo.

O tópico “calendários” por si só é bastante interessante e tem uma história cheia de tentativas de erros e acertos, merecia até uma edição própria. Se você tiver curiosidade, tá aí um tema que é bem legal de pesquisar. Num pequeno resumo, hoje o calendário mais utilizado no mundo é o gregoriano, nomeado em função do Papa Gregório XIII que em meados do século 16 resolveu colocar ordem na bagunça do calendário anterior (o juliano). A mudança não foi imediata, demorou séculos para ser implantada na Europa e no resto do mundo (a China, por exemplo, só foi adotar esse sistema em 1949). Ele não é um calendário perfeito, tanto pelo ponto de vista astronômico (alô, anos bissextos) quanto do ponto de vista de organização social (meses de duração irregular, que podem terminar em qualquer dia da semana, etc), mas quanto mais lemos sobre isso mais chegamos à conclusão de que é um pouco impossível ter um calendário “perfeito”.

O calendário gregoriano segue uma estrutura fortemente baseada na marcação do tempo pelo sol (duração de um dia e uma noite, estações do ano divididas pelos solstícios e equinócios, a duração de um ano inteiro equivalendo a um giro completo em torno do sol), mas também ainda retém vestígios da marcação do tempo pela lua (a quantidade de dias de uma semana é mais ou menos equivalente a quantidade de dias que a lua fica numa fase). Esses dois astros sempre foram parâmetro para a organização do nosso tempo, de uma forma ou de outra, e ao longo dos milênios diferentes formas foram tentadas e empregadas com sucesso por culturas variadas. Portanto, temos calendários: solares, lunares e lunissolares (que combinam os dois, mas que ainda seguem mais a lua). Mesmo que o gregoriano domine o padrão mundial hoje, os calendários lunares e lunissolares ainda são muito relevantes em muitas culturas, como a chinesa e a islâmica.

Recentemente tivemos o ano novo lunar. Mais precisamente, em 10 de fevereiro de 2024 (curiosidade: pelas tradições chinesas, com esse ano novo lunar entramos agora no Ano do Dragão). O calendário puramente lunar é todo baseado nos meses contados a partir de um processo completo de lunação, ou seja, o mês é o tempo para que a lua atravesse todas as suas fases — 29 dias e 12 horas. Portanto em calendários lunares os meses duram 29 ou 30 dias e o ano terá 354 ou 355 dias (somando aquelas 12 horas que “sobram” depois do vigésimo nono dia). A Terra, é claro, continua levando 365 dias e algumas horas para completar seu giro ao redor do sol, não importa o que a lua faça — para dar conta dessa diferença na quantidade de dias, a cada alguns anos pode-se então adicionar um mês extra no ano. É por isso que calendários puramente lunares não são tão comuns quanto os solares ou lunissolares, já que a posição do sol e as estações do ano em geral impunham restrições mais urgentes sobre agricultura, caça e pesca.

Quando seguimos o calendário lunar, os anos sempre terão a mesma quantidade de luas cheias: 12 lunações, marcando o ciclo de 29 dias e 12 horas em que a lua nova cresce, fica cheia, míngua e se torna nova de novo. (No calendário lunar, existem apenas fevereiros de anos bissextos! Brincadeira. Mas nem tanto.)

Porém, no calendário gregoriano, isso não se mantêm. Nossos meses têm mais dias, e nosso ano acaba tendo 10 ou 11 dias a mais. E com isso, um mês gregoriano abraça uma lunação inteira, porém não começa e termina exatamente no início e fim dessa lunação. Seja no início ou no fim do mês, sobram alguns dias com partes de uma fase de outra lunação. Isso faz com que as quatro fases da lua não caiam exatamente nas mesmas datas todo ano, e faz também com que em alguns anos (a maioria) tenhamos 12 luas cheias e em outros tenhamos 13.

(A diferença entre os tempos de sol e lua nos presenteou com uma lua cheia extra no calendário gregoriano, os lobisomens agradecem demais o feriado duplo.)

Isso acontece mais ou menos a cada dois ou três anos, aconteceu no ano passado (2023) e não vai acontecer esse ano. Assim, chegamos na Lua Azul, que é justamente essa 13º lua que ocorre a cada alguns anos.

Porém, todavia, contudo... como saber qual das 13 luas é a lua extra? A lógica talvez te faça pensar que devia ser a última do ano, já que... bom, veio por último. E que diferença faz, qualquer lua cheia é lua cheia, não? Bom, não! Quando todo o seu tempo está organizado em função de relacionar os corpos celestes a eventos naturais previsíveis, cada lua é única pois traz consigo o anúncio de algo específico.

Então, qual delas é a Lua Azul?

Nos anos em que temos 12 luas, temos 3 lunações completas para cada uma das quatro estações. Nos anos de 13 lunações, uma estação do ano fica com 4 e as outras com 3.

Ficou convencionado pelo Maine Farmers’ Almanac chamar de Lua Azul a terceira lua cheia de uma estação do ano que tivesse quatro lunações. Então, usando como exemplo o ano de 2023: o inverno teve quatro luas cheias, a terceira dessas luas foi a Lua Azul. Essa convenção foi adotada porque as outras 12 luas cheias já tinham seus próprios nomes e todos relacionados a características e eventos de suas épocas correspondentes. Realmente, seria estranho que as luas relacionadas a colheitas ou caças acontecessem um mês antes ou depois dos respectivos picos dos eventos que representavam.

Uma outra forma de determinar qual é a Lua Azul surgiu de uma confusão de interpretação. Convenhamos, é difícil mesmo. Segundo a Sky & Telescope de 1946, em um mês (do nosso calendário) que tenha duas luas cheias, a segunda será a Lua Azul. Ainda no nosso exemplo do ano passado, agosto teve duas luas cheias, a segunda foi a Azul. O problema dessa marcação é que a conjunção do nosso calendário com a movimentação do sistema Terra-Lua pode gerar algumas raras ocasiões que mais de um mês tenha mais de uma lua cheia e um mês do ano fique sem nenhuma. Isso aconteceu no ano de 2010: fevereiro sem lua cheia, enquanto janeiro e março tiveram duas cada. (Os lobisomens agradecem, mais uma vez.)

O nome “Azul”, sinto informar, não tem a ver com a cor da lua. Uma série de fatores pode influenciar a cor aparente da lua no céu, e nesse caso nada tem a ver com a quantidade de luas e época que ocorre. Há diferentes especulações sobre a origem do nome, mas são tão especulativas que é melhor você inventar a sua própria associação. Eu, particularmente, gosto de fingir que ela se chama assim por causa da música.

Inclusive, vamos fazer uma pausa agora para cantar Blue Moon tocada por The Marcels na abertura da novela O Beijo do Vampiro, deixar toda essa loucura dos calendários assentar antes de prosseguir. Não tem como falar em lua e não se deixar levar pela aura sobrenatural

Ao contrário da Lua Azul, toda diferentona e com um nome meio tirado do nada, as outas luas cheias têm nomes mais organizados quanto ao significado, a depender de qual cultura você considera.

Aqui vai uma listinha delas em ordem, e de quebra já deixei as datas em que vão ocorrer ao longo de 2024. Por tudo que já falei ali em cima, as datas mudam todo ano, mas ocorrem mensalmente e é bem fácil de achar na internet os cálculos para os anos seguintes. Incluí uma breve descrição dos “significados”, mas é importante ter em mente que esses nomes variam entre as culturas, e quase nada tem uma conexão direta com a nossa vida aqui na América do Sul com as estações ano invertidas em relação ao hemisfério norte.

Como tudo que vem de outras culturas, acho que essa é mais uma daquelas coisas que podemos decidir se vamos atribuir qualquer importância ou não, ou se vamos pegar e transformar o significado (ainda que apenas a nível pessoal). Outra observação importante a se fazer é que dependendo do fuso em que você se encontra, pode haver a diferença de algumas horas até um dia inteiro nessas datas. Se for relevante para você, recomendo checar em alguma publicação de maré do seu porto mais próximo as datas da lua cheia de cada mês e aplicar o nome de acordo. As tábuas de maré sempre têm os cálculos mais preciso para o seu local de residência.

Esses nomes, que são os mais popularmente conhecidos nas Américas, se originam principalmente dos povos Algonquin, que viviam na região que hoje é a Nova Inglaterra nos EUA, quando os colonos ingleses chegaram e influenciaram muitos nomes. Não à toa, o almanaque Maine Farmers surgiu também nessa área, fazendo parte de um conjunto de almanaques americanos que começaram a ser publicados na Nova Inglaterra no século 17. Os nomes em português são traduções livres feitas por mim:

  • 25/01/2024 – Wolf Moon/Lua do Lobo. Reza a lenda que seria a lua cheia em que os lobos estariam mais ativos e famintos em seus uivos, mais ou menos na metade do inverno. (Coincidentemente, ou não, essa é a época da reprodução de pelo menos algumas das espécies de lobo do hemisfério norte.)

  • 24/02/2024 – Snow Moon/Lua de Neve. Essa é normalmente a lua do auge do inverno do hemisfério norte, portanto o nome é quase auto-explicativo.

  • 25/03/2024 – Worm Moon/Lua da Minhoca. Aqui temos uma lua muito próxima do equinócio, da virada do inverno para a primavera, a neve começa a derreter e o solo ganha sinais de vida justamente através das minhocas voltando à superfície da terra.

  • 23/04/2024 – Pink Moon/Lua Rosa. Essa vem com os primeiros sinais da primavera, as primeiras flores começam a abrir e tingir os campos gramados de rosa. Essa é uma das luas com maior variedade de nomes, já que dependendo da região os primeiros sinais da primavera podem variar bastante.

  • 23/05/2024 – Flower Moon/Lua das Flores. Mais um nome que se explica bem facilmente, já que é a lua que costuma cair no auge da primavera, já distante do sofrimento do inverno e com as flores da estação dominando a paisagem. Nessa época, alguns alimentos já começam a ser plantados.

  • 22/06/2024 – Strawberry Moon/Lua dos Morangos. Literalmente é a época de colher morangos.

  • 21/07/2024 – Buck Moon/Lua do Cervo. Aqui estamos entrando no verão, os animais nascidos na primavera estão crescendo e especialmente os cercos começam a ter belos chifres para exibir.

  • 19/08/2024 – Sturgeon Moon/Lua do Esturjão. Essa lua cheia coincide com a época de maior abundância do peixe esturjão no hemisfério norte, um período em que a pesca se tornava farta para humanos e animais.

  • 18/09/2024 – Harvest Moon/Lua da Colheita. Esse é o nome mais fácil, não é? Aqui temos uma lua já muito próxima do segundo equinócio do ano, da virada do verão para o outono setentrional, entrando na época de começar a colher tudo que foi plantado na primavera.

  • 17/10/2024 – Hunter’s Moon/Lua do Caçador. Depois da colheita, é hora de ir atrás dos outros alimentos para se preparar para o inverno. Os cervos e outros animais já cresceram e engordaram, então os humanos vão à caça.

  • 15/11/2024 – Beaver Moon/Lua do Castor. O inverno aqui está batendo na porta, e os castores começam a se ocupar com a preparação para a estação fria. Em resposta, era também a época que os humanos iam a caça desses animais em busca de pele para confecção de abrigos e cobertas para se manterem aquecidos.

  • 15/12/2024 – Cold Moon/Lua Fria. E com ela fechamos o ciclo anual, é a lua que anuncia a mudança para a estação fria do hemisfério norte. Seja a última do outono ou a primeira do inverno, tudo que vem depois dela será gelado.

De fato, os nomes dessa lista ficaram mais famosos aqui no Brasil em tempos bem recentes, importadas do hemisfério norte principalmente com novas tradições místicas. O que não quer dizer que os povos indígenas daqui não tivessem também uma relação íntima com a lua. Os tupinambás já compreendiam a relação do movimento das marés com a lua muito antes de colonizadores pisarem aqui, os tupi-guarani sempre se guiaram pelas fases lunares para a caça e pesca por saberem que muitos animais se tornam mais ativos em determinadas condições de luminosidade. Também temos relatos dos nossos povos originários contando a passagem do mês pelas lunações, além de várias outras evidências de saber astronômico. Paralelo a esse conhecimento, a lua cheia também é importante para diferentes rituais, tendo significância religiosa e política.

A lua é a mesma no mundo todo, e é muitas na mesma medida que nós somos muitos.

Nessa semana em que começo a escrever a newsletter, a Porto da Pedra trouxe o “Lunário Perpétuo: A Profética do Saber Popular” como enredo, com direito a fantasia de lua para a Rainha da Bateria e a bateria toda fantasiada de lobisomem. Entre tantos livros e saberes literários incríveis que desfilaram com as outras escolas, acho que vocês vão entender porque eu me apeguei mais nessa.

Se você acompanhou o desfile, já deve saber um pouco disso. Caso não tenha visto e a existência desse livrinho de nome místico seja novidade para você, vem comigo aqui. Prazer, Lunário Perpétuo, um almanaque ainda mais antigo que o Maine Farmer’s.

Publicado pela primeira vez em 1594, Valência – Espanha, esse almanaque continha diversas xilogravuras organizadas por Jerónimo Cortez — astrólogo e matemático — e foi lançado numa época em que a inovação da imprensa tinha popularizado o alcance de livros impressos. Nele, encontramos conselhos sobre todo tipo de coisa da vida: horóscopos, datas de festas, dicas de saúde, navegação, religião... e, claro, as fases lunares. Uma mistura de ciência, mística e saberes populares, que na época não tinham uma distinção tão clara assim entre si. Uma confluência caótica e humana, editada ao longo de vários séculos com o crescimento desse conhecimento e levada para vários países, incluindo o Brasil.

Principalmente na região nordeste, se tornou um livro bastante popular. Havia quem seguia as previsões astrológicas, quem aproveitava os feitiços, e também quem acompanhava por conta dos cálculos celestes e meteorológicos das estações. Esse conjunto de misturas se encaixou bem com os saberes populares da nossa própria terra, sendo mais uma vez transformado em algo próprio do povo. Você pode conferir aqui mais sobre o enredo e a pesquisa da Porto da Pedra sobre o Lunário, onde a escola mergulha justamente nessa alquimia de saberes e cultura, e homenageia também Adriano Nóbrega e Ariano Suassuna.

É uma pena que com esse enredo a Porto da Pedra não tenha conseguido pontuação suficiente para pelo menos se manter no grupo. Eu não vou discorrer aqui sobre as razões do rebaixamento, não entendo tecnicamente de carnaval, assisto os desfiles para me encantar de peito aberto com o que as escolas propõem e com isso alimentar a minha própria imaginação. Arte se alimenta de arte. Várias escolas beberam de livros para seus enredos, os desfiles em troca servem e servirão de inspiração para outros fazeres e assim o moinho continua girando.

Uma coisa bem legal é que você consegue ler gratuitamente o Lunário Perpétuo aqui num português relativamente bem acessível na edição publicada em Lisboa em 1857: Mesmo no computador, passar essas páginas amareladas na grafia antiga já dá um certo arrepio. Ele começa assim:

“Pelo mundo se entende todo o Universo, no qual se contêm os Ceos, Estrellas, e Elementos, com as mais cousas creadas. Os Gregos chamarão a esta universal machina Cosmos, e os Latinos Mundus, que quer dizer ornamento, e adorno, pela formosura, e perfeição, que em si contém;”

(Fazendo um parêntese não tão parêntese assim porque um post do historiador Luiz Antonio Simas me lembrou de acrescentar essa informação altamente relevante para a sua vida: até o nosso querido carnaval é influenciado pelas luas cheias, sabia? Tanto o Carnaval quanto a Páscoa são datas móveis no calendário gregoriano, e adivinhe o motivo… Isso mesmo. Dependem da data que cai uma lua cheia específica! A Páscoa é sempre no domingo após a primeira lua cheia seguinte ao equinócio de primavera (do hemisfério norte, aqui fica sendo o equinócio de outono). Se a lua cheia do equinócio cair no domingo, o domingo seguinte é o de Páscoa. E então, desconta-se o período da quaresma para saber quando ocorrerá o carnaval. Não é por acaso que os papas sempre se interessaram por mexer em calendários, um dos principais motivos do Papa Gregório querer corrigir o calendário juliano era justamente acertar as datas do equinócio de primavera. Enfim, em 2023, o equinócio ocorre em 19 de março e a primeira lua cheia que vem em seguida é a nossa querida Lua da Minhoca, dia 25/03. O domingo seguinte, 31/03, é a Páscoa. O carnaval já é história.)

A nossa relação temporal com a lua é tão diversa e tão universal quanto qualquer elemento natural pode ser. Um corpo celeste constante é um corpo celeste confiável, podemos assegurar os nossos eventos importantes nessa promessa do céu. Mesmo que hoje não usemos o calendário lunar, a passagem do tempo pela lunação sempre pôde ser usada para diferentes práticas: obtenção de alimento, navegação, contagem dos ciclos femininos... Fãs da saga dos tronos, livros ou filmes, talvez se lembrem que o chá para as mulheres abortarem crianças indesejadas se chamava moon tea, o Chá da Lua. (Especialmente, o simbolismo da lua para mulheres é bastante vasto e merecia uma edição própria.)

Toda essa relação íntima com a lua pode ser obtida apenas pela sua própria observação. Nunca foi preciso que Um Grande Detentor do Conhecimento traduzisse isso, embora certamente a história do mundo esteja cheio deles. Esse conhecimento lunar já podia ser transmitido oralmente muito antes do registro em argila ou papel, e ainda pode. Hoje temos incontáveis aplicativos que podem até nos auxiliar a saber de forma bastante precisa as informações lunares do momento, eu mesma uso o tempo todo já que a silhueta dos prédios limita um pouco minha observação direta e a fase da lua é um ponto relevante para meu trabalho de oceanógrafa.

Para além disso, em qualquer oportunidade possível eu procuro a lua no céu. Gosto de chegar na janela e descobrir um sorrisinho brilhante sobre a minha rua, ou de estar dirigindo no interior e dar de cara com uma bola bem cheia e dourada tipo um queijo no meio das estrelas, ou de ver o reflexo oscilando na superfície do mar, ou até de chegar cedo no trabalho e ver que apesar de o sol já ter nascido ela ainda não se pôs. Gosto de ter esse contato sem o filtro das telas, ou da descrição de outra pessoa.

Os nomes das luas também me fascinam por conta dessa atribuição de importância a determinados eventos. Gosto de brincar com os nomes das minhas luas, seguindo meus eventos importantes do ano, mesmo que eles não sejam tão importantes assim. Lua do Relatório de Renovação de Bolsa. Lua do Aniversário de Casamento. Lua da Bienal do Livro. Lua do Estou Ficando Velha... Dia 24/02 com toda certeza (espero) não vai cair neve no Rio de Janeiro, mas por acaso tenho um compromisso marcado... quem sabe daí pra frente não passo a chamar essa de Lua da ********?

Quando estiver se sentindo meio sem referência, sendo lobisomem ou não, é só lembrar que a lua é sua também para marcar o que quiser.